quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

A Voz do Pastor- Dom José Francisco

 Lumen Fidei(parte 6)
Feliz daquela que acreditou (Lc 1, 45)

O papa Francisco termina a Encíclica Lumen Fidei com uma felicidade de palavras que só o espírito muito afinado com o Evangelho consegue encontrar. “Na parábola do semeador, São Lucas refere estas palavras com que o Senhor explica o signi­ficado da ‘terra boa’: ‘São aqueles que, tendo ouvido a palavra com um coração bom e virtuo­so, conservam-na e dão fruto com a sua perseve­rança’ (Lc 8, 15). No contexto do Evangelho de Lucas, a menção do coração bom e virtuoso, em referência à Palavra ouvida e conservada, pode constituir um retrato implícito da fé da Virgem Maria; o próprio evangelista nos fala da memó­ria de Maria, dizendo que conservava no cora­ção tudo aquilo que ouvia e via, de modo que a Palavra produzisse fruto na sua vida. A Mãe do Senhor é ícone perfeito da fé, como dirá Santa Isabel: ‘Feliz de ti que acreditaste’ (Lc 1, 45).”

Conheci algumas irmãs do Instituto de Vida Espiritual da França. São consagradas que se dedicam a cuidar de setores onde a Igreja, enquanto comunidade dos que creem, quase não se faz presente ou nunca acontece. Soube, por exemplo, que numa capital de determinado país elas mantem um restaurante. Imaginem, um restaurante! E que é frequentado por altas rodas socioculturais da sociedade local!

Pois é. Num canto desse lugar, num canto de honra, as religiosas ergueram uma gruta de Nossa Senhora de Lourdes. E tem mais. Toda noite, antes dos últimos fregueses encerrarem as atividades, toca-se suavemente o “Ave de Lourdes”, em flauta-doce: “O anjo descendo, num raio de luz, feliz Bernadete, à fonte conduz!” Imaginem essa cena num restaurantes chique do Rio ou de Niterói! Imaginaram?

Numa das noites, certa família judia comemorava uma data especial, ligada, inclusive, ao Ano Novo Judaico, quando, lentamente, começaram a ouvir o “Ave de Lourdes”. Grand finale! Indignação geral! Onde já se viu? Que falta de respeito com a sensibilidade religiosa dos convidados! Naquela circunstância, uma música católica numa festança judia era, praticamente, uma declaração de guerra. Chamaram a responsável, que fossem dadas explicações.

A irmã foi ao encontro deles e perguntou a causa de tamanha celeuma.

- Irmã, queremos saber por que as senhoras estão homenageando o maior ícone católico em plena festa judaica?

A irmã respondeu:

- Não estamos homenageando o maior ícone católico (apenas). Aproveitamos a presença dos senhores para prestar nossa homenagem a mais bela filha de Sião.

Silêncio!
Captaram?

É isso que a Encíclica diz. “Em Maria, Filha de Sião, tem cumprimen­to a longa história de fé do Antigo Testamento, com a narração de tantas mulheres fiéis a co­meçar por Sara; mulheres que eram, juntamen­te com os Patriarcas, o lugar onde a promessa de Deus se cumpria e a vida nova desabrocha­va. Na plenitude dos tempos, a Palavra de Deus dirigiu-se a Maria, e Ela acolheu-a com todo o seu ser, no seu coração, para que n’Ela tomasse carne e nascesse como luz para os homens.”

Só para terminar a história anterior… No dia seguinte, o restaurante recebeu um ramalhete de flores, da família judia, dedicado “A mais bela filha de Sião!”

Como seria bom se soubéssemos dizer as coisas na profundidade que elas carregam, com a simplicidade que elas têm. A fé é isso: Você dá o passo, Deus coloca o chão. Experiência que fez parte do dia-a-dia da Virgem. Tanto que o papa não tem medo de concluir uma encíclica dedicada à fé, com palavras dedicadas a Maria. Maria-de-fé, a mulher de todas as horas, de todos os momentos. A de sempre.

“No centro da fé, encontra-se a confissão de Jesus, Filho de Deus, nascido de mulher, que nos introduz, pelo dom do Espírito Santo, na fi­liação adotiva (Gl 4, 4-6)”. Essas são as últimas palavras do Papa na Encíclica. No centro da Fé, encontra-se Jesus. No mistério de Jesus, esconde-se Maria.

Convido vocês, irmãos, irmãs, a terminarem comigo essa série que dediquei a comentar a primeira encíclica do papa Francisco – Lumen Fidei – recitando a oração com que ele próprio termina o texto. Percebemos que essa prece não foi encontrada em qualquer livro. Aos poucos, conhecendo e apreciando a alma do papa Francisco, há quase um ano à frente da Igreja, conseguimos entrever, ali, em cada palavra e expressão, a expressão de um coração filial. Aliás, um coração filial que não tem medo de beijar as imagens de Maria que lhe são apresentadas, de um modo que nos é bem comum e querido. Quando ele consegue, ele abraça a imagem com carinho idêntico ao que fazemos com as lembranças queridas de nossas mães. Quando ele não consegue alcançar, ele toca a imagem com as mãos e traça sobre si, reverente, o sinal-da-cruz. Ele quer ser sagrado como a imagem é sagrada.

Esse exemplo do papa deve, realmente, ser seguido.

Rezemos:
Ajudai, ó Mãe, a nossa fé.
Abri o nosso ouvido à Palavra, para reco­nhecermos a voz de Deus e a sua chamada.
Despertai em nós o desejo de seguir os seus passos, saindo da nossa terra e acolhendo a sua promessa.
Ajudai-nos a deixar-nos tocar pelo seu amor, para podermos tocá-Lo com a fé.
Ajudai-nos a confiar-nos plenamente a Ele, a crer no seu amor, sobretudo nos momentos de tribulação e cruz, quando a nossa fé é chamada a amadurecer.
Semeai, na nossa fé, a alegria do Ressusci­tado.
Recordai-nos que quem crê nunca está so­zinho.
Ensinai-nos a ver com os olhos de Jesus, para que Ele seja luz no nosso caminho.
E que esta luz da fé cresça sempre em nós até chegar aquele dia sem ocaso que é o próprio Cristo, vos­so Filho, nosso Senhor.
Amém.

+Dom José Francisco Rezende Dias
Arcebispo Metropolitano de Niterói
Fonte: SECOM

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